domingo, 26 de maio de 2019

Cristo é caminhoneiro, madame


O imperialismo necessita milícias



Inócuo é listar e fazer comentários às asneiras linguísticas e conceituais dos ministros. Há antecedentes ilustres na flora reacionária. Varnhagem, o historiador paulista de Sorocaba, defendia a escravidão dos índios. É sabido o horror que os portugueses colonizadores, os progenitores dos bandeirantes tucanos, tinham da indiada. Duque de Caxias, temente do inferno, era a favor dos índios escravizados e condenava os negros africanos. Eis que parece Roberto Campos mas é o cronista Pero Vaz Gandavo tirando a culpa da classe dominante: “uma das causas por que o Brasil não floresce muito mais é pelos escravos que se levantam e fogem para as suas terras cada dia”.

Que os mariners invadam a Venezuela. O vice Mourão mantém fidelidade ao capitão-mor porque este livrou-lhe do entediante pijama anafrodisíaco e monótono do breviário. Sua alma gaúcha. Dei Gloriam. Sarava às Milícias positivistas de Inácio de Loyola. O general Heleno em seu travesseiro shakespeariano é sobressaltado pela guerra do Paraguay, porquanto ele aprendeu nas Agulhas Negras que o Exército Nacional não poderia tolerar a milícia imobiliária. Os militares do Haiti desdenharam Lott, o soldado patriota, e prestaram tributo ao general entreguista Silvio Frota. A gênese do bolsonarismo está na ocupação militar do Haiti tendo por comandantes Heleno e Mourão.

O abuso desumanitário feito no Haiti assemelha-se ao genocídio da Guerra do Paraguay, na qual se encontra a origem do golpe de 64. Eis a equação: o golpe de 64 está para a guerra da Tríplice Aliança assim como o bolsonarismo está para o Haiti. Mourão e Heleno admiram os generais de Napoleão Bonaparte no Haiti. Estes notabilizaram-se por alimentar os seus cachorros com os corpos dos negros.

A raiva bolsonara contra o Haiti é que Simon Bolívar morou por uns tempos lá e foi amigo de Alejandro Petión, o fundador da República e responsável pelo conceito de “democracia agrária”. Os generais Heleno e Mourão foram ao Haiti enviados por Lula e Dilma a pedido da ONU.

Não acredito que seja infundado o cotejo entre a Guerra do Paraguay e o Haiti. Mourão e Heleno pertencem à filiação do general Santander, bacharel em leis, “esse Mitre bogotano”, segundo Jorge Abelardo Ramos, o historiador marxista do Exército argentino. Santander foi considerado um amigo da oligarquia e dos ianques, fazedor de negócios e um liberal mau caráter.

Heleno e Mourão amaldiçoaram o chavista Simon Bolívar e teceram panegíricos obcenos ao Santander do Trump. Será obra do acaso que esses generais aprenderam o código de boas maneiras servindo no Haiti? Perguntem-lhes o conceito que têm do López Del Paraguay: bebum, mulherengo, ditador, racista, enfim, um monstro que deveria ser linchado por ter dito a célebre frase: “muero com mi patria y com mi espada en la mano”

Tudo é absolutamente anti-nacional no Exército Bolsonaro. Não sei se retornaremos ao dilema Lott ou Castelo Branco. O Paraguay resistiu 5 anos, mortos 250 mil crianças, velhos e mulheres com o Brasil cada vez menos desnacionalizado o Exército torna-se policial.

Dependência ou morte.

Com o vice Mourão não desapareceu o integralismo fascista. Em 1932 houve cento e oitenta mil adeptos. Muitos militares tornaram-se integralistas com refratários ao imperialismo inglês, mas não ao norte-americano.

Os golpes invariavelmente são gerados no interior do Estado, por isso assumem a forma militar. O golpismo é constituído de golpes brancos que são semelhantes, porquanto não há luta nem resistência.

O push integralista foi exceção, pois a iniciativa partiu do exterior do aparelho de Estado. Ainda que haja anistia na tradição brasileira, os golpistas militares (1955 e 1964) não premiados, e quem defende a legalidade é punido.

O panorama ideológico em escala mundial é determinante na deflagração do golpe. A essência é o conflito entre capitalismo e socialismo. O nazismo foi o capitalismo imperialista contra o socialismo. Este no entanto não é o contrário do nazismo e sim da democracia liberal.

1964 não perdoou os derrotados. Puniu e perseguiu quem defendeu João Goulart.

O anticomunismo é a ideologia dominante do golpismo.

Golpe branco, 29 de outubro, 1945. Getúlio Vargas foi apeado do poder quando deixou de ser “ditador”. O avanço da burguesia chocou o imperialismo. Getúlio Vargas, o maior líder burguês da história do Brasil, segundo Nelson Werneck Sodré.

Os chefes militares entregaram o poder a um golpista: Café Filho. Já em 54 queriam implantar um regime do tipo 64. Houve eleição: JK candidato de Getúlio Vargas. Ameaçado de não tomar o poder. Foi salvo pelo Marechal Lott que impediu o golpe branco.

JK terminou o mandato depois de uma desastrosa política econômica entregue ao capital estrangeiro. Jânio ganhou de Lott e logo abriu o país ao imperialismo. Oito meses depois tentou uma jogada palaciana e renunciou. Os militares tentaram impedir a posse de Jango. Golpe militar clássico, isto é, branco. Em 1961 o golpe gorou por causa da Campanha da Legalidade de Leonel Brizola. Da renúncia de Janio em 61 à derrubada de Jango em 64 foi a época mais democrática da história do Brasil.

Em 2018 o capital reformado ganhou as eleições. Será que hoje a ideologia anticomunista está fadada a revestir-se de um perfil psicótico? Nelson Werneck Sodré informou que logo à primeira quinzena de 1964 o Exército prendeu trinta mil pessoas. Eis a magnífica síntese histórica: “para impedir o avanço democrático no Brasil, o imperialismo necessita de uma milícia a seu serviço ou o que vem a ser o mesmo, necessita destruir as Forças Armadas nacionais”.

O soldado é substituído pelo policial que agride o povo e não defende o país.

Werneck Sodré, por mais que odiasse a ditadura de 64 com as suas torpezas e torturas, não se arrependeu de ter sido militar, nunca se envergonhou do “mister das armas”. Denunciou o equívoco de alguns militares ingênuos que têm a pretensão de serem “os monopolizadores do patriotismo”.

Eis a questão difícil de ser respondida: Bolsonaro eleito presidente significa que a ditadura de 64 foi aprovada pelo povo? Sua vitória colocou a ditadura em um plebiscito: o povo votou a favor. É isso?

Bolsonaro, o novo Collor? Este concorreu com Leonel Brizola e chegou ao poder apoiado pela mais poderosa TV do país, o que não foi o caso do capitão com a evangélica TV Record, Silvio Santos e Bandeirantes.

Exército Nacional sem política nacional é impossível. É o que mostrou Nelson Werneck Sodré, o maior intelectual das Forças Armadas, o soldado marxista em uma instituição que tem fobia ao comunismo, principalmente depois de 1935 com a “Intentora”. Quase toda sua vida ele passou no Exército, amargurado em 1964, tendo conhecido (ainda que não fosse amigo) os militares golpistas. Foi o historiador da burguesia brasileira que se vale do Exército para exercer o seu domínio: uma burguesia fraca que vem ao mundo junto com o imperialismo e temerosa da classe operária.

A carteira de identidade da burguesia brasileira é a vassalagem ao imperialismo. Nas últimas décadas as empresas multinacionais compraram o território do sol e da água doce. O servilismo ao capital estrangeiro aumenta dia a dia. Ser patriota é crime. Lincon Gordon decretou que o nacionalismo era obsoleto e, no poder, os militares concordaram.

O anticomunismo do Exército veio como um pacote externo. A Escola Superior de Guerra derrubou Getúlio Vargas. O objetivo de 64, segundo Roberto Campos, era entregar as riquezas nacionais às empresas multinacionais, principalmente a Petrobrás, o epicentro da política por onde se consubstancia a luta de classes.

O projeto ditatorial gorou em 1955 quando JK ganhou de Juarez Távora. Lott foi o herói da democracia. Em 1961 o golpe fracassou por causa de Leonel Brizola enfrentando Orlando Geisel.

Em 64 não houve resistência. 68 foi o ano do AI-5. Golpe dentro do golpe. Médici é escolhido tendo por condestável Orlando Geisel. A rotatividade dos chefes tornou-se a característica da ditadura brasileira. O responsável pelo desastre não é mais tal ou qual general, mas as Forças Armadas. O imperialismo sofisticou em sua estratégia. Não há ditador permanente.

E o que se passa agora na atualidade militar que se confunde com a atualidade política? A análise marxista não pode negligenciar essa questão sob pena de passar levianamente por cima do legado reflexivo que nos deixou Nelson Werneck Sodré em vários livros, principalmente o singular e estupendo A Memória de um Soldado. Biografia. Narrativa épica. Parece Frederico Engels que manejava artilharia e conhecia as manhas de todas as guerras europeias. Por causa disso, na casa de Marx, as suas duas filhas intelectualizadas o chamavam de “general” Engels.

Nelson Werneck Sodré levou a sério a lição de Marx em Guerra Civil na França: é preciso estudar o que é o Exército e o que é o “povo armado”. Recordando Horta Barbosa e Artur Bernardes, Nelson Werneck Sodré referiu-se à adesão de militares e trabalhadores na batalha nacionalista do Petróleo. A aliança militar com trabalhadores depende de circunstâncias históricas e da luta de classes. Há também o outro lado: o militar cipaio como é o caso de Juarez Távora, espécie de Paulo Guedes fardado que queria vender o território e entregar as minhocas.

Nelson Werneck Sodré ponderou com augúria: as Forças Armadas não são avessas à democracia. Não constituem tropa de ocupação a serviço dos países imperialistas, a favor do latifúndio e do capital estrangeiro. Elas não deveriam ser destruídas e substituídas por guerrilhas ou por um “Exército Popular”. Isso é romantismo esquerdista em torno da vanguarda armada do povo, ou seja, considerar as Forças Armadas como o principal agente da transformação anti capitalista. Equívoco.  Supor que a missão das Forças Armadas é impedir que as riquezas nacionais não sejam enviadas para o exterior.  Claro que, em tese, o militar não pode admitir a venda do patrimônio e o esfacelamento da Nação, como queriam Bulhões e Campos, os gurus dos gorilas golpistas.

Evoco a reflexão de Nelson Werneck Sodré porque ela reapareceu em minhas conversas com o piloto e matemático Sylvio Massa a propósito da clivagem entre os militares reacionários da reserva e a possibilidade de surgir militar na ativa que se insurja contra o entreguismo do capitão Bolsonaro.

Lembrei-me dos saudosos Bautista Vidal e Glauber Rocha. Visão errônea é confundir militarismo com defesa militar do território. Bautista Vidal era enfático, talvez por ter trabalhado no governo Geisel, que os militares não iriam entregar a energia vegetal do futuro para os países hegemônicos que não têm sol, portanto dependem do petróleo. Glauber Rocha, por outro lado, filmou o golpe de Estado de 64 e não atribuiu aos militares a sua gestação, tanto que em seu filme Terra em Transe o papel do general anti-golpe de Estado foi desempenhado por Mario Lago, que era um cantor, um ator comunista. Ademais, o cineasta considerava a burguesia civil corrupta e vendedora da pátria. O contrário seria a atuação revolucionária de alguns militares na história da América Latina. Mirem o exemplo de Solano Lopez, de Martí, de Bolívar, de Alvarado e de Hugo Chávez.

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Darcy or not Darcy, that’s the question




Em espanhol, La memoria de las memorias, chama-se o livro lindo da professora Haydeé Coelho sobre o exílio de Darcy Ribeiro no Uruguai. O exílio intelectualmente mais fecundo e profícuo da América Latina: quatro livros geniais, 2.000 páginas de 1964 a 1971.

Haydée o estuda na perspectiva certa, a bolivariana, sob o ângulo da Pátria Grande: edificar uma federação de Estados nacionais latino-americanos para se opor à Norte-Americana.

Darcy Ribeiro é o maior antropólogo da história da antropologia em escala universal. Não tem para ninguém. Por que afirmo isso? Ele fez a antropologia do continente latino-americano, sem deixar de trazer reflexões agudíssimas sobre os EUA, Canadá, como reconheceu a arqueóloga Betty Maggers, que traduziu O Processo Civilizatório para o inglês.

Haydée entrevistou em Montevidéu o brilhante antropólogo Renzo Pi Hugarte, ex-aluno de Darcy e tradutor de seus livros para o espanhol. Quem mais o conhece pelas entranhas filológicas e antropológicas. Renzo deu o melhor e mais profundo depoimento sobre seu amigo. Comovente. Profundo. Crítico. Talvez só um uruguaio poderia tê-lo feito. Uma beleza.

Um sedutor

Darcy era um professor nato. A aula ficava lotada. Um sedutor de mulheres e de homens. Falava muito bem. Era empolgado. Nada brochildo, tal qual acontece com a maioria da professorança universitária. Um teórico e um pesquisador de campo. Viu índio de carne e osso, e não apenas através de fotos. Dormia pouco. Trabalhava muito. Escrevia descalço. Sentava-se acocorado que nem caboclo. As idéias vinham-lhe em tempestade. Inventor de conceitos. Teve ajuda iluminada de sua mulher Berta, etnóloga exemplar, poliglota, romena, que chegou órfã em São Paulo, marxista. Darcy e Berta tiveram lua-de-mel no mato, e não no motel, entre os índios urubus-caapores. Caso único entre os antropólogos.

Ambos tiveram câncer. O de Darcy foi no pulmão, o de Berta no cérebro. Maldita doença.

Em Montevidéu, Darcy conviveu com os brasileiros Jango, Paulo Shelling, Glauber, Waldir Pires, Décio Freitas. Não teve é contato com Leonel Brizola, então distante por causa da briga com Jango. Os dois políticos ficaram sem se falar durante onze anos.

Na época de Montevidéu, Darcy ainda não tinha sólida formação marxista, mas com o tempo converteu-se no herdeiro de Marx como teórico do subdesenvolvimento e dos povos atrasados e espoliados.

O professor Baldus, em São Paulo, na década de 40, fez a cabeça de Darcy e Lévi-Strauss, o qual perde no entanto em quilometragem etnológica.

Baldus apresentou Darcy a Rondon.

Apesar de incursionar por outras veredas, Roger Bastide apreciava a obra teórica de Darcy Ribeiro, que nunca embarcou nas modas e modismos made in USA e Oropa.

Silêncio infame

Foi uma dádiva para o anticolonialismo nas ciências sociais Darcy não ter estudado na Europa nem nos Estados Unidos, mas conhecia em profundidade os maiores autores europeus e norte-americanos. Dona Margaret Mead foi lá visitá-lo. Deslumbrou-se com alguns capítulos de As Américas e a Civilização.

Enquanto isso, nas bandas de cá, ninguém falava dele nos cursos de ciências sociais. Silêncio infame. Criminal. Como se fosse responsável pelo golpe de 64. Mas sabotaram-no foi por inveja e mesquinharia. Ele era o the best one. Por causa desse boicote, FHC se fez presidente da República. Um dia algum pesquisador idôneo irá revelar o paralelismo Darcy-FHC. Quase todos os professores comeram mosca.

Do Canadá, Florestan Fernandes, Florestão, trocou cartas com Darcy. Foi o único, mas não furou o bloqueio da USP. A Cepal calou o bico, o Museu Nacional cuidou das couves, Sérgio Buarque de Holanda e Antônio Cândido estavam em outras.

Na Venezuela plantou a semente de Hugo Chávez. Infelizmente não cruzou por lá com Ludovico Silva, tradutor de O Estilo Literário de Karl Marx.

Revista Caros Amigos
Ano XI número 132, março de 2008
Página 37: “Gilberto Felisberto Vasconcellos narra o exílio de DARCY RIBEIRO”
Compilação: Matheus Rosa.


sexta-feira, 17 de maio de 2019

Ordem e Protesto



Protesto em Floripa/2019 - Foto: Rubens Lopes

            Calderón de la Barca dizia: “cuidado com as águas mansas”. Estava tudo aparentemente em ordem e tranquilo, mas de repente desbotou a maquiagem que vinha desde o plano real: a voz da raiva tomou conta das ruas.

            Atenção. Protesto não é resistência, insurreição, tampouco indício de situação pré-revolucionária; todavia isso não significa, como quer o quietismo do pijamão universitário, golpismo contra a Dilma. Também não é como sugerem os ponderados afrescalhados, estéril manifestação volátil por não orbitar na esfera da representação oficial da política.

            A verdade é que a burguesia não tolera de que a política seja feita de modo extra-parlamentar. O bom senso, segundo os âncoras burgueses da TV, é ficar em casa quietinho e, na hora da voto, votar segundo os candidatos da telenovela. É isso a democracia safadamente identificada com capitalismo. Ora, o objetivo do capitalista não é a liberdade, e sim o lucro. Com ou sem democracia o importante é o lucro.

            Não é por acaso que a palavra mais usada pelos parlamentares e jornalistas é “democracia”, a qual não teria nada a ver com a luta de classes. Não vemos nenhum professor salsichão na TV falando que o capitalismo é contra a democracia. É preciso tomar cuidado com a edição do protesto feita pela TV. Não nos esqueçamos de que o sistema televisivo é totalitário desde as suas origens.

            O protesto tem que ir além da palavra de ordem pequeno burguesa, a qual dá a entender que o mal do mundo é inerente ao capitalismo, mas não é a essência do capitalismo. A essência deste é a exploração da força de trabalho.

            Quanto ao vandalismo, é preciso esclarecer que, como dizia Carlos Marx em O Capital, acumulação primitiva e originária do capital foi feita de maneira vândala, explorando o trabalho infantil e o trabalho das mulheres. Então, eis a verdadeira palavra de ordem: capitalismo é vandalismo, vândalo é o latifúndio agrobusiness, vândalo é o banco, vândalo é o plano de saúde, vândalas são as tarifas telefônicas, vândalo é o show pop, vândala é a indústria farmacêutica, vândala é a imprensa, a qual é a mais empresa do que informação. Os âncoras jornalistas correm o risco de não poderem sair de casa. Cagaço. Estes profissionais da mais-valia ideológica são terroristas.

            Os protestos começam a amedrontar a mídia quando os alvos dos protestos assumem dimensão anticapitalista. Estes alvos estão localizados nos consórcios de bancos, empresas multinacionais, televisão e grandes jornais. Sem esquecer o latifúndio Monsanto que produz comida cancerígena e remédio que não cura.

            Não é preciso dizer que o protesto vai pegar fundo se a classe operária entrar na parada, aí é que o bicho pega. Lenin dizia que o ataque ao partido político é uma estratégia da burguesia. O ataque ao partido político é incentivado pela telenovela. Hoje está na moda substituir o conceito de classe social por massa popular. Daí a mistificação do pluralismo que serve para esvaziar o conceito de classe social e de exploração do trabalho.

            É claro que o sarampão antipartido se justifica por causa da escolástica do sistema representativo. Mas isso não exclui a necessidade de se ter um partido de massas de esquerda. Enquanto não aparece uma direção revolucionária, como queria Leon Trotsky, é importante desenvolver uma gramática de desobediência civil expressa na tecnologia digital com epigramas e aforismos radicais. Mas, cuidado, dona Odete, a história não é feita pela internet.

Revista Caros Amigos

Ano XVII, número 197, agosto de 2013
Página 08: “Gilberto Felisberto Vasconcellos: Capitalismo contra Democracia”

Compilação: Matheus Rosa



sexta-feira, 10 de maio de 2019

Ludovico Silva en Mi Sueño


Yo fui a encontrarme con Ludovico Silva en Venezuela en su Caracas querida, de calles petroleras y kapitalyzmus cadilac. Yo miraba el cielo para ver si era el mismo cielo del poeta. Yo andaba por los cafés quería tomar unas copas del antiguo vino con él, charlar y oir su voz. Tenía ganas de emborracharme con su poesia hecha de música. ¿Cuántas voces había en su filosofía?

Un muchacho que estudió griego para asimilar la obra de Karl Marx. ¿Qué locura es esa de hablar con las palabras escritas por un muerto?  ¿Que tenía yo que ver con la ciudad de Ludovico? En mi sueño iba por la noche y cantaba el día inútil. Si, un día inútil más. Me acordaba de lo que había leído de Leon Trotsky: ¿que és un día de trabajo? Me pregunté a mi vejez sin futuro: ¿por qué ahora quiero yo aprender a hablar español? Es para hablar con Ludovico, Ludo, loco, lúcido de ira y amor.

Su lengua dulce y coloquial es aquella que más me hizo sentir latinoamericano, pero sabía que Ludovico no conoció el Brasil, no oyó Villa Lobos, no vio las películas de Glauber Rocha, solamente leyó Darcy Ribeiro.

Yo sentía el tiempo del cementerio, yo soportaba con disimulo Caracas sin Ludovico. Los maestros conformistas andando en coches yanquis. Ninguna mujer me esperaba para decir cosas sabrosas en mis oídos. Juré no más viajar. Basta .De ahora en a delante me voy a viajar al rededor de mi cuarto. Hay que soportar la soledad sin alcohol y sin ninguna droga. La poesía no tiene boca para besarla. Antes hay que reírse en dolor.

Qué lindo nombre de libro este de Ludovico: Escribe y Pasa. Un día me voy a escribir sobre su obra. Como pudo el haber sido un borracho si escribió 12 libros sobre el tema de alienación en Karl Marx! La vida es hecha de misterios. La mercadería es el peor de los misterios porque hace mal a la felicidad.

Ludovico y yo odiamos el dinero. Siempre hay dolor de comprar y vender, incluso el alma que el diablo no la quiere más. Bello verso que me suena el fin del amor ya no hay luna en tus ojos. Estoy muriendo de miedo a la vida. Solo desde la tierra se puede ver el cielo.

Adiós, Ludovico.

quinta-feira, 9 de maio de 2019

A Democracia da Cagada



Há várias maneiras de avaliar a democracia ou a falta de democracia em determinado país, mas seguramente um dos mais importantes critérios, embora isso choque a pudicícia dos moralistas, é o modo e o lugar em que as pessoas defecam no dia a dia, no trabalho, no escritório, na fábrica, na escola, no bar, na rua, no mato, no restaurante, na cadeia, na rodoviária, no hospital, no ônibus e no bueiro.

Sabemos todos que a defecação é um ato fisiológico humano universal: do nascimento até a morte. Seja qual for o país, a cultura, o regime político, a classe social.

Defecar é uma das exigências biológicas do ser vivo: chinelão ao mais graúdo ou bacana milionário.

Viver é defecar. Por isso não seria descabido falar em uma antropologia da defecação, porém do que se trata aqui não é empreender uma reflexão sobre a universalidade da defecação ou sua história, e sim compreender o modo particular como esse ato fisiológico se realiza na sociedade brasileira.

Eis a pergunta: existe um modo específico de o homem brasileiro defecar? Quais são as suas condições sociais e higiênicas? Como é a engenharia do vaso sanitário? De que maneira se faz a limpeza do ânus? Quais são os temores e as angústias de não conseguir encontrar um lugar apropriado para uma boa defecação? É possível falar em uma política pública de defecação? Como é que as prefeituras e os municípios encaram essa questão?

Pontos de vista

Pode-se ou não, quanto a isso, estabelecer a clássica clivagem entre esquerda e direita? O que é o ponto de vista reacionário ou progressista diante do homem defecando?

É possível afirmar que existe uma memória coletiva de defecação? Ou esse ato fisiológico está restrito apenas à experiência individual íntima e intransferível? Em muitos aspectos da nossa vida, o começo é o fim, mas, em se tratando desse assunto, o produto final - o excremento - revela a situação existencial do indivíduo, ou até mesmo a modalidade de seu caráter.

O exame de fezes é uma exigência clínica para o médico conhecer a quantas anda a saúde do paciente no interior de seu corpo e o reflexo disso em sua alma.

Esta pergunta faz sentido: de que modo e quantas vezes você defeca? - aí diremos quem você é. Na cultura da sociedade contemporânea foi a psicanálise que vulgarizou a conexão entre o caráter da pessoa e o aparelho digestivo, ao afirmar que comumente o indivíduo sovina, econômico, pão-duro padece de prisão de ventre, enquanto o esbanjador de dinheiro, o tipo perdulário, seria aquela pessoa com o intestino solto e diarréico, como se houvesse estreita correspondência entre o excremento e o interesse que se tem pelo dinheiro desde a mais tenra idade, quando a criança começa a lidar ou a brincar com suas próprias fezes.

O estômago é macho

A conhecida fase anal da personalidade humana é indissociável da função excretora, por onde são eliminadas do organismo as substâncias pelas vias naturais.

A alimentação constitui um dos maiores prazeres da vida. O estômago governa a vida, diz o provérbio. Luís da Câmara Cascudo, quem melhor estudou a história da alimentação no Brasil, lembrava que o estômago é macho, o sexo é fêmea, porque o estômago exige ser satisfeito de maneira implacável, enquanto o sexo pede ser desviado, substituído, sublimado.

É triste presenciar pessoas que sofrem de hipocondria do estômago, sempre desconfiadas ante o prato de comida, com medo de se envenenar ou de passar mal, sendo portanto incapazes de conhecer o prazer da digestão até a etapa final: a feliz defecação.

Júlio Camba, famoso nutricionista espanhol, falando sobre a fisiologia do gosto, defendia a tese de que um bom prato de comida deve nos proporcionar satisfação psicológica. Do que se trata aqui é a democracia da cagada, e não a cagada da democracia.


Texto publicado na Revista Caros Amigos
Ano XI, número 131, fevereiro de 2008
Página 37: “Gilberto Felisberto Vasconcellos disseca a cagada como fenômeno cultural”
Compilação: Matheus Rosa

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Educação sentimental do caminhoneiro marxista



Bota Sebastian Bach
na boleia
Tira o sertanejo universitário
dos ouvidos do caminhoneiro

O proletariado na estrada
         A viagem da mercadoria
                           A voz da fábrica
                                     O camponês
                                                     O pé
                                             O pneu
                   O pequeno burguês
A Petrobrás
                                          A greve geral.