sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

A Democracia Grampeada vista por Karl Marx

Não há como escapar...

Se a conversa da presidência da República já foi grampeada, então adeus vida privada.

Todos somos dedos-duros.

Terrorismo da escuta: é isso a delação Lava Jato.

Somos o país de delatores premiados.   

O Supremo Federal se nutre de arabescos linguísticos horrorosos. É a mesma retórica dos jesuítas: usar a língua para esconder o pensamento.

O juiz é um sofista. Afinal, não é a constituição que cria o povo, mas é o povo que cria a constituição. Tudo está invertido. O homem não existe para a lei, mas sim a lei para o homem.

A linguagem do Supremo não é ciência, e sim escolástica. A sociedade civil é o cenário dos interesses antagônicos, incluindo a polícia e o judiciário.

O executivo é a administração burocrática. A burocracia pressupõe o espírito de corporação. O espírito burocrático é jesuítico e teológico.

A burocracia, segundo Marx, é a “republique prêtre”. Ninguém escapa da burocracia. A autoridade é a base do conhecimento. A hierarquia é burocrática.

A existência do burocrata se confunde com a existência do departamento nas universidades.

Todo católico almeja ser bispo ou papa. O exame é o batismo burocrático do conhecimento. O examinador acha que sabe tudo.

Os cristãos são iguais no céu, mas desiguais na terra e no bolso. Os indivíduos membros do Estado são iguais na Constituição e diferentes na sociedade.

Karl Marx criticou a jurisprudência com a Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Charlatanismo jurídico é a combinação da vontade dos pobres e o sentimento de caridade dos ricos.

Os pobres são eles mesmos os responsáveis pela pobreza. O pauperismo é o resultado das deficiências na administração e da gestão incompetente.

O Supremo Tribunal Federal deveria ser tal qual o amor: nem comprar, nem vender.

A liberdade de imprensa não pode ser permitida se ela compromete a liberdade pública, dizia o jovem Robespierre citado por Marx em A Questão Judaica.

Inferno é não ganhar dinheiro.

A lei legitima a opressão do pobre pelo rico. Owen, o fundador do movimento socialista, considerava as coisas mais abomináveis o casamento, a religião e a propriedade.

Os tribunais estão profundamente imbuídos de teologia em sua maneira de se expressar e ver o mundo. Todo direito é o direito à desigualdade.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Samba da sociedade infeliz

109 anos de Noel Rosa

A indústria capitalista do barulho. A mais-valia acústica deforma a audição. Os trabalhadores são as principais vítimas. Em muitas atividades funcionais do dia a dia é dispensável o ruído, mas este nunca desaparece; ao contrário aumenta cada vez mais.

A anatomia civil da sociedade capitalista depois de 1945 exige a abordagem sonora. É isso o que fez Theodor Adorno completando a análise de Marx que não conheceu a eletrônica. Esta não altera a essência do capitalismo, porém o rádio e a televisão interferem na maneira de ouvir, falar e pensar.

O repúdio capitalista ao silêncio. A morte deixa de ser surda com a motoca. Se a consciência de classe do proletariado for depender do funk, estamos fodidos.

Falsa alegria. A música popular entorpece o ouvido. A capacidade de conversar é erodida. Ouve-se sem ouvir. Afasia é coletiva.

O ouvido do trabalhador continua dentro da fábrica ao ouvir a indústria cultural.  A telenovela está fora e dentro da fábrica.

Interclassista com massa sobrante e os estamentos multinacionais. Luta de classes. A onipresença do ruído é burguesa.

Ninguém é maluco de afirmar que o real curso da história depende do que se ouve; todavia equívoco é não considerar que a classe social no subdesenvolvimento está envolvida em relações sonoras e óticas. Os partidos políticos operam com o mesmo padrão acústico, a despeito das diferentes classes que eles representam.

A impressão que se tem, analisando o programa eleitoral gratuito, é que a sociedade é uníssona. Todos os sons são um único e mesmo som.
Nos últimos 50 anos a compulsão tagarela, falar sem dizer nada, suprimiu o desejo de ouvir. A cortesia é do barulho.

A posse da ministra do Supremo Tribunal Federal foi entoada por cantor de telenovela. Redundante é falar em juristização da política. Na verdade o judiciário é um apêndice da telenovela.

Viva Marcela
Lá lá lá
Viva telenovela
Lá lá lá lá

Roliudi forneceu o aplicativo cosmético para o star-system. Reparem a gravata de Gilmar Mendes, o ministro Flux trocando de abotoadura, Levandowski pintando o bigode de Merval Pereira. O judiciário espelha e reproduz a gestuália telenovelística.

O banco é o sujeito, o predicado é o judiciário.

Karl Marx, que fez a crítica do direito de Hegel, dizia que o banco era o areópago da nação, ou seja, o Supremo Tribunal de Atenas.

O julgamento jurídico legitima a sociedade dividida em classes. A lei, em sua origem, é política.

Inexiste juiz imparcial, assim como a igualdade democrática é uma quimera.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

Leonel Brizola e os filhos do doutor Roberto Marinho



Estarei eu a tresvariar dizendo que a TV Globo pode fazer as pazes com Leonel Brizola? Ou ele continua o seu inimigo póstumo? Derrotado por Collor em 1989 disse que seria ruim essa televisão deixar de ser propriedade de brasileiro. Confesso que fiquei atônito com isso; afinal, Leonel Brizola levou bordoada o tempo todo de Roberto Marinho, o seu principal opositor político desde antes de 1964.

Com a ditadura esse conflito não fez senão acirrar-se; conflito não de natureza pessoal, porquanto aos olhos do caudilho a TV Globo continua funcionando como agente das perdas internacionais. É a TV da ocupação imperialista que justifica o lucro exportável.

Quem paga o anúncio escolhe a orquestra. O anunciante é multinacional. Inexiste televisão que seja nacional na Ásia, África e América Latina. Todavia, um proprietário estrangeiro seria um desastre. Imaginem um Murdoch ao invés de Roberto Marinho.

Se o território está vendido, tudo está vendido.

Decerto os filhos do doutor Roberto Marinho estão inteirados da correspondência entre o pauperismo no Rio de Janeiro e o descenso da TV Globo.

Será que a TV Globo não mais põe nem tira presidente da República?

A Record é uma TV-Igreja-partido com mensagem transmitida por pastores e militantes pagos. A presidência da República está nas mãos da oligarquia evangélica.

Ainda que sem fazer uso do púlpito fraudulento, Henrique Meirelles pediu oração para a economia ir bem, dando a impressão que Jesus Cristo é seu amigo desde o Consenso de Washington. Esse charlatão durante o governo Lula chefiou o Banco Central.

Com Temer ficou ele todo saidinho, exibido, metidaço, cheio de si, bonecoso, mas não conseguiu livrar-se de sua medonha dicção aerofágica.

O imperialismo exorbitou o dualismo regional entre São Paulo e as demais regiões.

A TV Globo, cúmplice do golpe de 64, entrega o poder midiático ao bispo Macedo.

Na cúpula da Globo cogita-se a providencial transferência do Papa de Roma para o Rio de Janeiro.

A burguesia evangélica começou pela acumulação feita com o dízimo.

Gondim da Fonseca, o inventor do vocábulo “entreguismo”, dizia que a UDN era católica, o berço da TV Globo.

Ninguém foi mais profundo que Karl Marx: a moeda é católica, o crédito é protestante.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Kit marxista folk

Matar a cultura é exterminar um povo

Amalgamar o marxismo com a ciência do povo não desperta entusiasmo nem de um lado nem de outro, nem da parte dos marxistas nem dos estudiosos do folclore.

Dizem que estou louco, que Luis da Câmara Cascudo era um aristocrata, filho de papai rico, tomava água em copo de cristal. E mesmo depois que o pai morreu, não perdeu sua personalidade aristocrata.

Marx nunca teve vida fácil em termos de dinheiro. Eu penso que no Brasil esses dois saberes científicos teriam de se juntar em um todo teoricamente orgânico. O povo e a classe social indissolúveis.

Marx morreu dormindo aos 65 anos, escrevia até às quatro da manhã, fumava muito e tomava café com estômago vazio.

Quando fui visitá-lo (Luis) pela única vez em sua casa na Junqueira Aires pela manhã, fui informado de que ele só recebia as pessoas do meio-dia em diante.

Ia da rede de dormir para sua máquina Remington de escrever.

O silêncio da madrugada percorre as páginas de seus livros. O melômano. O musicólogo pensando a música depois de ficar surdo.

Ludovico Silva, poeta venezuelano que ensinou marxismo para Darcy Ribeiro, viu semelhança estilística entre Marx e Betoween.

Não deslembrem que no folclore encontra-se a busca incessante da particularidade do Brasil no processo civilizatório.

A sociologia da USP com Florestan Fernandes decretou o imobilismo do folclore como se fosse um túmulo, como se nele estivesse ausente o devir histórico.

Isso não é verdade porque a cultura popular se dinamiza na fala e nas coisas que o povo diz.

Não por acaso Luis da Câmara Cascudo foi exímio linguista e extraordinário semiólogo.

Marx afirmou que a linguagem é a consciência prática do homem.

Creio que o fato de o Brasil possuir um dicionário do folclore deveria ser objeto de reflexão filosófica. Da minhoca ao cosmos.

Em sua totalidade a polis brasileira pode ser expressa pelo léxico do folclore.

Se Karl Marx tivesse vindo para cá, desembarcando na praça 15 no centro do Rio de Janeiro, ouvindo os pregões de rua, decerto iria conhecer o Brasil por Luis da Câmara Cascudo, em cuja obra está transfigurado o jeito do povo viver, sonhar, comer, falar, trabalhar e morrer.

O povo está muito mais em dom Luis do que em qualquer outro grande autor marxista.

O marxismo é a ciência da revolução, mas a ciência da revolução pressupõe o conhecimento do povo em seus quadrantes regionais.

Por isso não vejo antinomia entre folclore e marxismo.

Não vamos cair na esparrela de recusar essa programática revolucionária por não estar visível a luta de classe nas peripécias do Sacy Pererê e nas andanças do lobisomem subproleta que desce do norte para o sul.