domingo, 29 de maio de 2022

Sob as ordens da memória e da miséria

 


Beleza o estilo de Oswald de Andrade reencontrado em seu último livro Diário Confessional. 

Como trevas do dinheiro: "quando espera a glória vem o oficial de justiça". A verdade é que desproletarizaram Oswald de Andrade. Queria fazer uma pequena enciclopédia proletária.

Seu pai tropeiro, condutor de tropas da Serra do Picu, Itamonte, Minas Gerais, para o Rio.

Herdou a diabetes de sua mãe. "Minha mãe gorda, e tutelar, mandava dar gorjetas ao cozinheiro ou ao Maitre D'Hotel para nos servirmos bom peixe".


Apenas a natureza: "as condições especiais dos trópicos(clima nudista de natureza farta). Nossa indígena como protótipo detentor dessa weltamshauumg é a minha tese apoiada em missionários e viajantes".

Abominava o marxismo escolástico e de caráter jesuítico. Criou a trialética: o ocioso, o senhor e o escravo. Eis o enigma na crítica literária: "O suicídio poético de Rimbaud, a quebra do instrumento". Lembra o desabafo de Glauber Rocha: "as mulheres queriam que eu fosse Rimbaud, e os homens queriam que eu fosse Godard".

Infância; "as crianças não enlouquecem". Como primeiras enunciações dos meninos são silábicas. Aprender a falar é reproduzir o que ouve, segundo Mattoso Câmara em Princípios da Linguística Geral. Oswald de Andrade: "o importante é o que se ouve, e não o que houve".

Marxismo. "Observação sensacional de Engels. O homem deixou de devorar o adversário para fazer-lo prisioneiro e escravo".

Velhice pobre: "sou um rato vivo, pulando atrás de queijo que tem o direito de roubar para mim e para os meus".

O nome do maridão: "o matriarcado desliga do amor a ideia da gestação". Menciona a sociedade da algema e da arquitetura cowboy de Bauru.

O problema da literatura brasileira é que ela não anda de ônibus. "Pagamos ainda o dízimo ao estrangeiro".

Não queria uma velhice velhaca. 

Antropofagia, palavra grega que significa comer carne humana. Isso não quer dizer que a antropofagia não tem sido amiga do homem. Eu acho infeliz a escolha desta palavra para designar seu reflexão filosófica. É que seu pensamento vai além disso. A devoração consiste em uma estratégia para evitar o utópico e o escatológico.

Ficou fascinado com a palavra "antropofagia" que encontrou em Shakespeare, e não a largou até a final da vida. Ficou na contemporaneidade como o único filósofo antropofágico. O apego a esse conceito de antropofagia não restringiu o alcance de seu pensamento e nem prejudicou seu estilo literário.

Pau-Brasil, por outro lado, não é uma palavra grega, projeta um vegetal de canso pano. Pau vermelho. Pau ensolarado. O nome Pau-Brasil é muito mais representativo do trópico e apropriado como expressão da que antropofagia.

Na poesia de Oswald de Andrade a vegetação prepondera sob o animal e o mineral. Não esqueçam que a mão-de-obra da extração da madeira começou com o índio e depois com o negro escravizado pelos donatários. Empresários da escravidão tentando fortuna com o pau-brasil. A primeira perda internacional da economia, diria Leonel Brizola. A madeira cobiçada pelos contrabandistas ingleses, franceses, portugueses e holandeses. A devastação ecológica com fogo na floresta. O binômio trágico nos acompanha até hoje: fertilidade dos trópicos e capitalismo antiecológico.


O golpe da Petrobras

 


Sucessivas mudanças no comando da Petrobras. Nada mais do que um astucioso e malandro golpe de Bolsonaro. Agora ele vai tentar abaixar o preço da gasolina e ganhar a simpatia da população. Assim, coloca a culpa nos diretores "malvados", ainda que estes sejam seus amigos. É sua velha lógica conspirativa agindo. Acredite quem quiser. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos, veiculado no programa Campo de Peixe, da Rádio Campeche, conduzido pela jornalista Elaine Tavares. (28.05.22)


domingo, 22 de maio de 2022

Energia limpa: o sonho de Bautista Vidal


Já tem novo livro no arraiá da internet. É o Capitalismo Sujeira Socialismo limpo, editado pela jornalista Elaine Tavares. Uma discussão sobre ecologia, energia, socialismo. O capitalismo é uma maré que vai nos afogar. Ele provoca o fim das florestas, o fim da água saudável, as epidemias. Se a humanidade persistir nisso, morrerá asfixiada. Esse é o tema do livro. Uma catarse, um encontro imaginário com Bautista Vidal e Marcelo Guimarães. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos, veiculado no programa Campo de Peixe, da Rádio Campeche, conduzido pela jornalista Elaine Tavares. (21.05.22)


A Última Etapa do Imperialismo é o Rechaço ao Seio da Mãe Gentil


Ousadia de Nildo Domingos Ouriques ter escrito "Reflexão sobre a Ameaça Fascista: O Segredo de Bolsonaro". É que o senso comum acadêmico, sem entender o conceito de fascismo, acaba usando-o a torto e a direito. O fascismo é o acontecimento, a par do stalinismo, de maior complexidade social e política do século XX. Embora não sejam simétricos, fascismo e stalinismo mantêm entre si determinadas correspondências, conforme mostrou Leon Trotsky. 

Ironizamos que não é toda segunda-feira que temos fascismo. Cuidado com as palavras que fazem os conceitos. Grossura, arbitrariedade, atentado à liberdade, censura, violência - isso não basta para caracterizar o que seja fascismo. 

A boçalidade de massa no capitalismo videofinanceiro é sem dúvida fascistóide; todavia, do ponto de vista político, para existir fascismo é preciso que haja ofensiva da classe operária organizada, tendo no horizonte a perspectiva da revolução socialista. Trotsky dizia que o fascismo tinha por objetivo destruir as organizações operárias, e que a vitória de Hitler na Alemanha foi preparada pela política stalinista do Kremlin, ainda que não se deva confundir fascismo com stalinismo. 

O contrário do fascismo não é o socialismo, e sim a democracia liberal, ou seja, o fascismo é a supressão das liberdades burguesas. Para o povo a palavra liberal denota um sujeito franco e generoso. O fascismo é um dispositivo que a burguesia lança mão para erradicar as conquistas da democracia liberal. Isso é o fascismo que medrou na Alemanha e na Itália durante a década de 30. Esses países, reparou Trotsky, eram sequiosos de colônias no Terceiro Mundo; daí o seu expansionismo, ao contrário do imperialismo democrático da Inglaterra e França que tinham colônias. 

A reflexão de Trotsky foi retomada na década de 40 por Ernest Mandel na Bélgica e Jorge Abelardo Ramos na Argentina e, recentemente, por Samir Amin e John Bellamy Foster. Não deslembrar do livro Fascismo ou Socialismo de Theotônio dos Santos na década de 70, quando o continente latino-americano estava sob uma ditadura milico-civil-multinacional. 

A análise de Trotsky foi feita em Prinkipo, Turquia, quando de seu exílio, distante do palco dos acontecimentos na Europa. Para existir fascismo é preciso que haja pequena burguesia enlouquecida. É célebre a frase: nem todo pequeno burguês se transforma em Hitler, mas há um Hitler em todo pequeno burguês enlouquecido. O temor do pequeno burguês em época de crise econômica se traduz no pânico de se ver rebaixado à condição operária ou sub-proletária. 

O fascismo atende aos interesses da burguesia financeira e não aos da pequena burguesia. Não resolve apelar à palavra “autoritarismo”, que foi usada de maneira astuciosa pelos sociólogos petucanos para ocultarem os interesses de classe. A Lava Jato de Harvard colocou Lula no xilindró para ser morto politicamente com o auxílio da TV Globo. O problema é que nessa orquestração surgiu Jair Bolsonaro que não estava nos cálculos e previsões do tucanato. Isso não quer dizer que haja incompatibilidade entre este e aquele. Na verdade em cada tucano há um Bolsonaro latente,  adormecido, enrustido. Surgiu súbito e inesperado, quase como um raio em um céu azul, e está sendo agora um candidato da classe dominante, referendado pela burguesia bandeirante, o latifúndio, os setores financeiros internacionais e os proprietários dos meios de comunicação de massa, sem deixar de mencionar o patriciado jurídico e os altos escalões da igreja. 

O economista de Jair Bolsonaro é Paulo Guedes, um Chicago boy que fez a cabeça genocida no Chile contra Salvador Allende, uma reduplicação intelectualmente piorada do entreguista Roberto Campos.

Recordo-me do cineasta Pier Paolo Pasolini que desde 1942 refletiu sobre o fascismo na Itália de Mussolini, que é a mistura da maldade com estupidez para salvar o capitalismo. Pasolini distinguiu o fascismo psicológico do fascismo histórico. É a opressão dos ricos e a reserva mental da burguesia. Valeu-se da expressão clérico-fascista, a aliança do Estado com a Igreja. 

Haja capitalismo inevitavelmente haverá o germe do fascismo. Da relação contraditória entre democracia liberal e fascismo não se deduza que este será suprimido definitivamente pelos democratas liberais. Somente o socialismo pode eliminar de vez o perigo do fascismo. 

A cor local do fascismo varia conforme sua latitude. Na Itália deu força para o legislativo em detrimento do judiciário, mas em outros contextos pode suceder o contrário, por exemplo, entre nós poderá acontecer uma hipertrofia do judiciário.

Infortúnio histórico seria o PT chegar de novo ao poder e passar a mão na cabeça dos inimigos do povo. O PT fofinho. O PT comovido com a Avenida Faria Lima. O PT que acredita ter superado a contradição entre capitalista e trabalhador assalariado. 

Trotsky comparou o líder fascista ao gangster Al Capone. Tal qual Bolsonaro, Mussolini e Hitler ganharam fama sem terem feito nada de extraordinário. Hitler exibia traços de monomania com sua “ideologia epiléptica”, enquanto Mussolini era uma fanfarronada cínica.

Em seu livro Empirismo Herético Pasolini sublinhou que a sociedade interclassista de massa permite juntar o manager com o proleta. Não se admire que Jair Bolsonaro seja curtido como herói em Wall Street e na Ilha da Maré. Nem chorar nem rir aconselhava Karl Marx citando Baruch Espinoza, mas compreender. A ofensiva reacionária é mundial. Já foi dito que o ocaso do capitalismo vai ser mais doloroso do que foi o seu início. 

O pai do Trump frequentava a Ku Klux Klan. O guri foi mimado vendo linchamento de negros. O seu guru é o Henry Kissinger que bombardeou o Camboja e sabotou o Pró-Álcool de Bautista Vidal. 

Da superestrutura videofinanceira surgiu o caubói Bolsonaro, o Mazzaropi da Barra da Tijuca. Visto pela psicanálise de Wilhelm Reich e da personalidade autoritária estudada por Theodor Adorno, Jair Bolsonaro é um badameco sádico-anal. Sua misoginia coloca em primeiro plano a conjunção do pênis com o ânus e a ojeriza ao órgão sexual feminino. O temor masculino de ser triturado pela vagina dentata, comido pelo útero vampiro, converte-se em programática política: “só para homens”, como dizia Oswald de Andrade.

Releva dizer que Jair Bolsonaro expressa um sentimento que parece estar generalizado na sociedade: o repúdio ao seio da mãe. A raiva contra a mãe reverbera na raiva contra a mulher em geral. Sem dúvida é um escândalo porque a mãe segura a sobrevivência da família pobre, e não apenas dando de mamar. É preciso fazer uma análise do caráter neurótico do homem brasileiro. A recusa do seio da mãe está conectada ao hábito da Coca-Cola, à macdonização do paladar ao adubo cancerígeno da Monsanto. 

Jair Bolsonaro é o protótipo da aberração gástrica de massa. Não estou a fim de psicologizara anomalia da crueldade: o problema não está em Bolsonaro, e sim nas coisas que o geraram. A sociedade brasileira está doente, assolada por um rentismo que corrói o corpo e a alma. Bolsonaro tem apoio da alta burguesia paulista e dos estamentos multinacionais. 

O rentismo está consubstanciado na Bíblia de Edir Macedo, o pastor dólar, o compadre atua afinado com o empresário Medina, o homem do Rock in Rio. Medina é comensal da TV Globo. Inexiste antítese entre Edir Macedo, o proprietário da Record, e a Marinho family. O ultra-imperialismo midiático é a fusão de rentistas na classe dominante.

Quanto mais miséria, mais igrejas. A expansão evangélica corresponde ao caráter rentista e especulativo do capitalismo monopolista. Todo fundador de Igreja, seja qual for, revive o São Paulo gestor, burocrata e empreendedor.

**Este artigo foi escrito antes de Jair Bolsonaro ter sido eleito presidente da República.   

domingo, 15 de maio de 2022

Capitalismo Sujeira Socialismo Limpo


Já está pronto o livro que fala sobre outra energia para o mundo. Memória de Bautista Vidal e Marcelo Guimarães. O capitalismo e sua sujeira. O petróleo e sua sujeira movendo o mundo. Marca do crime, da guerra. Até hoje nunca deu um santo. O socialismo é limpo e não pode ser edificado sobre uma energia fóssil. O socialismo precisa do sol, do vegetal, da biomassa. Este é o tema do comentário de Gilberto  Felisberto Vasconcellos, veiculado no programa Campo de Peixe, da  Rádio Campeche, conduzido pela jornalista Elaine Tavares. (14.05.22)


Novo livro à venda - Capitalismo Sujeira Socialismo Limpo


Já está disponível mais um e-book de Gilberto Felisberto Vasconcellos. É o "Capitalismo Sujeita Socialismo Limpo", que discute a questão da energia no Brasil trazendo para o debate a proposta de Bautista Vidal e Marcelo Guimarães Melo do uso da biomassa. Gilberto aponta que o regime social é o que determina o modo de usar a energia. Isso significa que usar a biomassa no capitalismo não altera o problema social nem o caráter predatório da economia. Por isso a proposta da biomassa precisa vir acompanhada de outro modo de produção: o socialismo. O livro analisa todo o processo de destruição causado pelo uso do petróleo e pelo sistema capitalista e propõe outra matriz energética junto com outro sistema e modo de vida. O livro está na plataforma Hotmart e custa 20 reais. Encomende já o seu.

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sexta-feira, 13 de maio de 2022

Nuestro Cyro Gomes desencana de mister Unger uber de Harvard

Cena do filme Taxi Driver

Leonel Brizola passou um puxão de orelha no Roberto Mangabeira Unger: caro professor, política é briga de foice no escuro. Claro que Mangabeira entendeu a metáfora. Volta e meia desembargando por aqui com uma teoria a fim de prová-la na prática. O país poderia ser qualquer país nessa teoria abstrata.

Em todos os seus escritos é tênue ou inexistente a referência ao imperialismo norte americano. Não encontramos a importância que foi dada por Leonel Brizola à Carta Testamento. Sir Mangabeira não gosta de citar autores brasileiros. A solução para nossos problemas está delineada nos autores estrangeiros. É o esnobismo fátuo. É a sabedoria imperial de Harvard.

Ciro Gomes pegou carona no “desenvolvimentismo” burguês e, querendo ou não, descartou Gunder Frank e Leonel Brizola. No regime das perdas internacionais, o que desenvolve é o um por cento privilegiado que está desenvolvido, ou seja, o subdesenvolvimento desenvolve o desenvolvido.

domingo, 8 de maio de 2022

A afasia do genocínico


Foto: Sergio Lima / AFP

Não tem como fazer psicanálise do genocida, genocínico. Mas, pode-se fazer uma psicopatologia desse farsante. Há que desmascarar a sua incapacidade de produzir discursos. Ele tem um distúrbio na fala. Ele tem uma dificuldade de nomear as coisas, não consegue propor nada, é um sujeito a/gramatical. Há uma decadência fônica e léxica. Não há pensamento político. E a rede Globo faz coro com esse obscurantista. Ela não é contra esse vende-pátria. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos, veiculado no programa Campo de Peixe, da Rádio Campeche, conduzido pela jornalista Elaine Tavares. (07.05.22)


sexta-feira, 6 de maio de 2022

Os BitousRolinstones são coadjuvantes da peste pop Covid agrobiusinis



Sumiu da cultura a pergunta: o que representa a música na transformação da sociedade? 

A música como atividade autônoma. A cantora que canta tal que o pássaro cantando, de fala que Karl Marx referindo-se ao valor de uso. Isso acabou com os Bitols.

O direito ao barulho é erroneamente concebido como liberdade individual. 

Aqui no Brasil para existir progresso é preciso suprimir o barulho, sobretudo o barulho dentro da família. A família do barulho.  Não existe mais conversa. 

O povo é embrutecido pelo barulho. Quanto mais barulho mais júbilo sente a classe dominante, quer nacional, quer multinacional. A vítima do barulho são miseráveis.

Silenciem como sereias.

Para o corpo favelado o barulho dá prazer. Falso prazer. O prazer sem prazer. É uma "satisfação" dos Rolling Stones. Expande-se a alienação fonográfica junto com o pauperismo.

A onipresença da música se justapõe e suplanta o ruído das máquinas e das motocas. A música tornou-se o muzak das máquinas. Que música? Isso já não importa. Qualquer música comercial e pornô. 

Os Bitous colocaram como crianças para trabalhar. Como canções produzem a mais-valia-acústica com a neurótica alteração do batimento cardíaco. Não é mais o coração órgão propulsor do sangue arterial de Noel Rosa, cuja voz era a do timbre fumante e tuberculoso.

O pop traz a morte reacionária da família. A banda de Rock dança com a corporação Standard Oil que deu o golpe de 64. 

O capitalismo é ruído. Por isso não há nada a comemorar nas efemérides da Tropicália. 

O que é o sincretismo sob o signo do capital monopolista? O rock sincrético foi uma arma usada no Vietnã. O popapocalipse anti-ecológico de Francis Coppola.

Bob Dylan já estava na jukebox da Chrysler em 45 rotações.

O prazer na alienação foi um dos grandes temas da filosofia da música de Adorno. Picharam-no de filósofo ranzinza contra o coito enaltecido pela "música corporal". Os amantes ouvindo um sonzinho. Uma mercadoria do amor.

Afinal, amar quem é que sabe? Só o poeta fodão fonográfico multinacional. Espraiou-se por todos os lugares que o crítico é um chato, antipático, ressentido, invejoso. Aliás, não existe mais crítico de música nem crítico de cinema. 

José Ramos Tinhorão ficou sem emprego arrumar por causa da pressão exercida pelas fábricas de ruído audiovisual.

Citarei Glauber Rocha: "o cinema é uma indústria da comunicação popular, mas não uma indústria como o cigarro ou o automóvel". Claro que o cineasta não estava falando do cinema baixo nível que justifica a guerra do Pentágono.


terça-feira, 3 de maio de 2022

O socialismo limpo


O debate sobre a energia, o petróleo, a biomassa. O capitalismo sujeira, o socialismo limpo. Humanidade x natureza. A contradição entre o petróleo e a energia vegetal. Vem aí um livro novo discutindo a energia baseada no sol, uma homenagem a Bautista Vidal e Marcelo Guimarães. O Brasil, o maior país tropical do planeta, fonte de um necessário socialismo limpo. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto  Vasconcellos, veiculado no programa Campo de Peixe, da  Rádio Campeche,  conduzido pela jornalista Elaine Tavares. (30.04.22)


Do marxismo mágico ao socialismo da fotossíntese


Bautista Vidal, o criador do Pró-álcool combustível, com certeza iria vibrar de entusiasmo com o filósofo André Merrifiel por ter sugerido a fotossíntese como a essência do marxismo mágico em Gabriel Garcia Marques, Henry Lefebvre, Guy Debord, Aimé Césaire. Outros poderiam figurar no rol dos radicais da fantasia materialista, a exemplo de Oswald de Andrade, Glauber Rocha, Álvaro Vieira Pinto e Darcy Ribeiro. 

Que não falte o autor de Prelúdio e fuga do Real, Luis da Câmara Cascudo, o filósofo da fabulação popular, que não era marxista mas que viu no povo a paixão pelo valor de uso. Consultem meu livro “Folclore: Socialismo no povo.”

Senhoras e senhores, time is not money. 

Certamente o marxista inglês Merrifiel, que descende de Willian Blake, Thomas Morris, Eduard Thompson, concordaria com a afinidade entre marxismo e folclore, a ciência do povo que está mais para Rabelais do que para Descartes. 

O marxismo mágico, que lembra a estética do sonho de Glauber Rocha, é folkmarxista. Não deslembrem que a cultura popular no Brasil durante os primeiros séculos é o conúbio oral do sol com a água. Burrice a desatenção de muitos marxistas diante do caráter revolucionário do folclore. 

Não se esqueçam de Edison Carneiro, o historiador marxista das rebeliões populares, entendido em Umbanda.

Luís da Câmara Cascudo escreveu A Ideologia Alemã de Marx e Engels com outro estilo: “não se vive apenas de versos, mas de pão, exclusivamente quem vive é o padeiro”. 

Oswald de Andrade alertou para a necessidade dos “olhos livres”, Luís da Câmara Cascudo acrescentaria: ouvidos limpos para as muitas orelhas. Andy Merrifield vive na Inglaterra, e não nos trópicos da rede de dormir e do cangaço. 

O marxista venezuelano Ludovico Silva, comentando o conceito de indústria cultural, acusou a televisão de ser um aparelho ideológico da insônia, a peste da insônia segundo Gabriel Garcia Marques, que foi em Barcelona assistir às filmagens de Cabezas Cortadas, a mistura folk de Shakespeare com Goya. 

Andy Merrifield aponta o livro de Engels, A Origem da Família, como o exemplo poético de marxismo mágico, que parece A Marcha das Utopias de Oswald de Andrade. 

Avancem para o Sol! O sol é valor de uso.

 Nascemos em 1500, antes havia os índios, odiados pela burguesia bolsonara, que odeia a rede de dormir, o milho, a comunhão com a natureza. 

O marxismo mágico é refratário à comida envenenada de supermercado. A expressão “marxismo mágico” é do uruguaio Eduardo Galeano, o discípulo de Vivian Trias, o marxismo que nasce, renasce com paixão e mistério. Depois que o marxismo deu inúmeras provas que é científico, por que não concebê-lo sob o critério mágico?

Cavalcanti Proença sublinhou a intimidade que os personagens de José de Alencar têm com a mata. O romancista não tinha a menor predileção por cães e gatos, nem a “cavalos citadinos”. 

Marcelo Guimarães dizia-me que os intelectuais brasileiros não são capazes de nomear dez tipos de cipó. A roça é associada à pernilongo, nunca ao pirilampo. Pier Paolo Pasolini observou a decadência da Itália com o sumiço dos vagalumes.

Na indústria cultural o que existe é a substituição da ideologia por mentira, ou melhor, a decadência da mentira, segundo Oscar Wilde. A música foi concebida por Theodor Adorno como defesa contra paranoia. Penso na acústica descoberta do Brasil sem motoca e sem latido de cães. 

A vassalagem de Jair Bolsonaro ao imperialismo não é diferente da Fiesp e do petucanismo.  

A cabeça católica do povo está sendo substituída pela cabeça evangélica. Segundo meu amigo Yago Eusébio Rocha temos dois líderes religiosos de massa no Brasil: Padre Cícero e Edir Macedo. 

Em carta a Laura, filha de Marx, Engels em 1893 reclamava da classe operária desorganizada. 

Laura fez a revisão em língua francesa de a Origem da Família. Os EUA desde sua origem são modernos e burgueses. Comparem EUA com a Rússia, “sociedade gentílica”, pré-civilização com economia natural. 

É inutilidade o mote tortura nunca mais. A repulsa bolsonara ao seio da mãe gentil é anti-vida. Lá vamos nós sem o bico do seio da mãe. Mamemos na pirocacola! 

Em Totem e Tabu de Freud o pai é amado, os filhos são privados de mulher. 

Evangélicos boys. Um dos piores infortúnios ocorridos na história do Brasil, sem que se saiba ainda os motivos pelos quais isso ocorre por opção eleitoral, foi o surgimento de Jair Bolsonaro, um desastre civilizacional sem precedente. 

O desejo genocida de matar quem não se salvou na ordem social. O estranho gozo de matar os pobres. 

Inimaginável um marechal Castelo Branco chegar no Palácio e abrir o jogo: eu sou reacionário. Ou um Roberto Campos ou um Eugênio Gudin se proclamando de direita. Havia um certo escrúpulo em defender a dominação burguesa como o melhor dos mundos. Hoje isso é escancarado de maneira insolente. Não há promessa de que melhores dias virão. 

Meninão, babaca, parecido com o Mazzaropi. Simbolicamente Jair Bolsonaro só tem pai e filho, e não mãe. O pai é gerador do filho. O pênis útero. Uterocídio. A mãe falha e assassinada. A mãe não presta. Então, vem a pergunta: como explicar uma mãe que admira Bolsonaro? O que é a mãe evangélica? O universo evangélico é cruel, repressivo, machista. Onde está a Virgem Maria? 

O seio materno é o primeiro objeto sexual da criança. O desejo da mamadeira de piroca é dar ao povo um pênis truculento. A criança não deve desgrudar-se do seio da mãe. A gagueira bolsonara insistentemente repete: estupro, homossexual, pênis, ânus. Fala de sexo e da genitália, mas nunca em amor. Presidente pornô e misógino. Os filhos machos tomam o partido do pai: desprezam a mãe castrada. O bebê tido como futuro comunista. A sucção no peito da mãe é malvista, o desmame é miliciano e agressivo. Reparem o contorno labial de Jair Bolsonaro falando na TV. Freud tem razão: a anatomia é o destino. No início do século Freud teve um paciente que tinha uma obsessão neurótica do “eu do pai”. A raiva e medo do órgão feminino. É isso o conteúdo da misoginia: a mulher trouxe o pecado ao mundo.