sexta-feira, 26 de maio de 2023

Por uma Floripa ateniense


Queria muito que a Elaine Tavares fosse prefeita de Floripa. Uma Floripa ateniense, um jardim das delícias de Epicuro, filósofo sobre o qual escreveu Marx. Há que eliminar o bolsonarismo da terra de Elaine Tavares, que já foi brizolista. É preciso impedir que Floripa se torne uma Miami. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos no Programa da Rádio Comunitária Campeche, apresentado por Elaine Tavares. (20.05.2023)


Há uma direita popular


A vitória de Lula foi importante para o Brasil. Mas, até agora essa foi apenas uma vitória eleitoral. Falta muito para que se possa ver um vitória política. A direita é forte e é popular. Há que atuar com uma comunicação mais eficaz e não se entregar para os meios comerciais. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos no Programa da Rádio Comunitária Campeche, apresentado por Elaine Tavares. (13.05.2023)


Glauber, Getúlio, Goulart, Darcy, Brizola

 


              Foto do documentário de Silvio Tendler


O trabalhismo getulista insere-se no campo cultural e artístico de 1954 a 1964, o cinema novo nasce por essa época entre Salvador e Rio de Janeiro. O biógrafo João Carlos Teixeira Gomes: no dia em que Getúlio Vargas suicidou-se, Glauber Rocha aos 15 anos o pranteou na praça da Sé em Salvador.

Dentre todos os cineastas brasileiros Glauber Rocha é o mais getuliano. Declarou: “sou janguista”. Jango, o filho espiritual de Getúlio. Jango Uma Tragédia chama-se a sua peça de teatro. Em Jangarana, alusivo ao Sagarana de João Guimarães Rosa (o paralelo boiadeiro Rosa e Jango) Glauber Rocha ficou injuriado com os ataques vindos de todos os lados. Identificando-se com ele: Jango c’est moi.

Terra em Transe,1967, a queda de João Goulart é o ponto de partida para se pensar as contradições entre a civilização e a natureza no Brasil. A vitalidade da natureza dos trópicos estava em seu primeiro filme Pátio. Irá ressurgir em A Idade da Terra, no qual um samba cantado por Jamelão enaltece a figura do doutor Getúlio. O golpe imperialista em 1964 foi anti-ecológico, a nação afastou-se da natureza, a história separou-se da geografia. Em seu filme Cabeças Cortadas o Brasil é gerado em uma sociedade de senhores e de escravos; mais tarde esses senhores se aliam à cobiça imperialista, defendida pelos lacaios Juarez Távora, Eugenio Gudin, Roberto Campos e Magalhães Pinto.

A briga cinematográfica de Glauber Rocha com o censor Carlos Lacerda antecipará o golpe de 64. A censura de Carlos Lacerda ao filme Deus e o Diabo na Terra do Sol é o reflexo da UDN pró-EUA. Carlos Lacerda inimigo da Petrobras getuliana, ele é o mercenário Antônio das Mortes no filme O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, ainda que para isso não seja relevante estipendiar o quanto o ex-governador da Guanabara levou de propina da Standard Oil.

Glauber Rocha focalizou o desencontro entre getulistas e marxistas em 1954, o povo queria incendiar simultaneamente os jornais Globo de Roberto Marinho e A Classe Operária do partido comunista. Há um nexo entre a comunicação de massa e a história política, não só pela direita (Carlos Lacerda) como pela esquerda com o Samuel Weiner “rooseveltiano”, segundo o cineasta.

Entrevistada em 2005, Denise Goulart, filha do ex-presidente conta que durante o exílio no Uruguay o general Assis Brasil que tinha por insurgência segurar o esquema militar do governo deposto, fez uma visita a João Goulart e acabou sendo esbofeteado por dona Maria Tereza Goulart. Bem feito.

O MDB, depois PMDB do doutor Ulysses, queria que João Goulart e Leonel Brizola tivessem morrido no exílio.

Um aspecto de todos os exilados em 1964 Jango foi o único que não conseguiu voltar. O potiguar Djalma Maranhão também morreu de saudade no exílio de Montevidéu.

Denise evoca o dia da reconciliação, pouco antes de seu pai morrer, com Leonel Brizola. Uruguai, 1976. Eu ouvi em Montevidéu que Jango chegou inesperadamente na casa de Leonel Brizola, convidado por Neusa Goulart. Ao perceber o lance, Brizola trancou-se dentro do quanto, não queria falar com o cunhado.

D. Neusa: - Leonel, Janguinho está aqui.

Depois de alguns minutos ele sai do quarto e abraça e beija Jango. Pareciam dois namoradinhos. Assim é que se reconciliavam os velhos gaúchos.  



terça-feira, 9 de maio de 2023

O passado não deve ser esquecido

 


Não se pode tripudiar o passado. Como dizia Godart, o passado ainda está na nossa cola, é um fantasma. Digo isso porque ainda estou atônito com a vitória de Bolsonaro nas eleições de 2018. E também com o apagamento do passado que ele provocou. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos no Programa da Rádio Comunitária Campeche, apresentado por Elaine Tavares. (06.05.2023)

Cultura brasileria

 


Incumbiram-me de uma tema: a cultura brasileira. Essa coisa que está no cotidiano das pessoas. Há a cultura erudita, há a cultura da indústria popular e há a cultura popular. A vida das gentes, o que se come, o que fala e o que se sonha. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos no Programa da Rádio Comunitária Campeche, apresentado por Elaine Tavares. (29.04.2023)

O fascismo videofinanceiro

 


Sou como Pasolini. Queria fechar as TVs particulares, esses aparatos fascistas, destrutivos e perigosos. A TV padroniza, aliena, e está a serviço do imperialismo estadunidense. Também como Pasolini detesto a violência irracional, aquela que não está direcionada para a luta de classe. Hoje temos visto a violência sem razões. Este é o tema do comentário de Gilberto Felisberto Vasconcellos no Programa da Rádio Comunitária Campeche, apresentado por Elaine Tavares. (15.04.2023)

quarta-feira, 3 de maio de 2023

Sem teoria revolucionária é retórica a revolução


Nildo Domingos Ouriques mostrou que nas últimas eleições Ciro Gomes se aproximou de Mangabeira Unger e deixou o legado trabalhista de Leonel Brizola a ver navios. Saibam quantos lerem o Cascarrabias de Joaçaba que é necessário a revolução socialista na abordagem do presente como história. A interação dialética do mediato com o imediato, que está em Hegel e Lênin, depois desenvolvida em História da Consciência de Lukàcs, não deve na latitude subdesenvolvida ser substituída pela oposição entre pobres e ricos.

O palavreado vale de lágrimas sobre a pobreza menoscaba o conceito marxista de super-exploração da força de trabalho que define, segundo Ruy Mauro Marini o conjunto da nossa vida social. Ocultar a superexploração do trabalho é a mistificação empreendedorista, quer no púlpito católico, quer na tenda pentelhocostal de Edir Macedo.

Estamos lidando com a tríade clérigo, bacharel e economista. Da primeira missa em Porto Seguro ao Lava Jato de Kurytyba. Tudo entre nós redunda na tediosa linguagem jurídica da paráfrase, cuja origem está na religião, conforme informou Karl Marx. Religião, direito e agora indústria cultural com os ancoras metidos a besta. Iniciados em conventos, os cursos jurídicos bacharelavam os filhos do latifúndio e os purificavam com água benta. Lei e “padre nosso”. E lei, como se sabe, nunca foi sinônimo de justiça. Recorde-se a lei do ventre livre.

Oswald de Andrade dizia que o câncer da cultura brasileira era a Faculdade de Direito Largo do São Francisco por onde passou imperceptível o jornalista Roberto D’Ávila que em 1989 dirigiu a campanha eleitoral de Leonel Brizola na televisão. A maior contribuição cultural da Faculdade de Direito foi o trote, segundo a bela sacada de Oswald de Andrade.

Leonel Brizola entrou na política em Porto Alegre com a carteira de identidade anticapitalista. Ao contrário de Getúlio Vargas e João Goulart, que se tornaram anti-imperialistas no decurso do tempo e de suas militâncias, Leonel Brizola em 1945 percebeu que o problema essencial do país era a dependência. Segundo Paulo Shilling, representava Leonel Brizola o nacionalismo popular revolucionário. Anti-imperialista, conforme sublinhou o trotskista Edmundo Moniz, diferente de Mario Pedrosa que, depois de passar pela Quarta Internacional em Paris, virou petista.

Segundo Leonel Brizola, informou Edmundo Moniz, não há desenvolvimento (ou melhor, progresso) para o povo sem revolução socialista. E revolução não se faz sem mudar a classe social que está no poder, de modo que burguesia industrial desenvolvimentista nunca frequentou o léxico brizolista. Edmundo Moniz, prefaciado por Nelson Werneck Sodré, filmado por Glauber Rocha, sublinhou a originalidade histórica de cada revolução, e não ficou adstrito à preocupação bizantina se LeonelBrizola leu ou não O 18 Brumário de Karl Marx.

Nildo Domingos Ouriques terá muito a ganhar assimilando a metodologia histórica de Leonel Brizola. E, para isso, convenhamos, não precisa ser correligionário de Lupi e Manoel Dias.

Depois de morto Leonel Brizola está a vagar no céu do povo e pode se materializar em algum projeto revolucionário. O PTB lhe foi surrupiado pelo general escroque Golbery em conluio com Ivete Vargas. Aí teve o líder gaúcho que dar nó em pingo d’água e criar o PDT sem base operária e com uma pequena burguesia descolarizada.

O argentino Jorge Abelardo Ramos, adolescente em Buenos Aires, chegou à concepção bolivariana da Pátria Grande com as ideias de Trotsky e de Manuel Ugarte. Considerou Leonel Brizola tão revolucionário quanto Che Guevara. É reacionário supor que haja burguesia desenvolvimentista. A Fiesp em 1964 derrubou João Goulart, segundo Gunder Frank. O papel da Fiesp foi relevante tal qual as Agulhas Negras.

Escândalo gnosiológico é afirmar que o “colonialismo mental” é quem engendra o subdesenvolvimento, segundo rezam os antimarxismos de Ciro e Mangaba. O que existe desde o século XVI é o colonialismo como realidade econômica. O colonialismo é um sistema. Destarte, é intrigante essa ênfase no “colonialismo mental” porque desde o seu livro A Alternativa Transformadora de Mangabeira inexiste a rapina na América Latina. A rapina imperialista é progressiva.

Quanto vale a Vale do Rio Doce? Era a pergunta dolorosa do geólogo Marcelo Guimarães. A Vale é que nem a mãe, não tem preço, a mãe não tem valor de troca.

Marcelo Guimarães na década de 60 cunhou a frase “minério não dá duas safras”. Governador que manejou o executivo, Ciro Gomes carece de tomar conhecimento da brasiliana brizolista, que começa com o poeta Gregório de Matos, passa por José Bonifácio, Lima Barreto, Edmund Moniz, Glauber Rocha, culminando com a escola da biomassa de Bautista Vidal.

O currículo “professor de Harvard” é um arabesco colonial que integra o idioma javanês, como dizia o escritor Lima Barreto. É colonial o tesão de Ciro Gomes pela sabença de Harvard.

O embaixador Lincoln Gordon de abjeta memória era professor de Harvard. Mangabeira em seus livros não cita nenhum autor ou militante brizolista, Paulo Schilling, Joel Rufino dos Santos, Berta Ribeiro, Zé Kéti, Arnaldo Mourthé, Oscar Niemayer, Vera Malaguti. O desprezo pelos intelectuais nativos é o reflexo de seu complexo metropolitano de superioridade.

O desenvolvimentismo manufaturado por Ciro Gomes origina-se no pacote tecnológico alienado da CEPAL.  Simon Bolívar ou Monroe? O desenvolvimentismo requentado prefere Monroe e acaba por defender o crime colonial que extirpou a população indígena. Essa atrocidade metropolitana não é diferente do capitalismo videofinanceiro, rentista e imperialista, que recapitula a ocupação colonial.

Matar índio e importar escravo – este é o ponto de partida do empreendedorismo colonial. Mangabeira Unger como toda a direita é indiferente ao que havia antes das caravelas de Cabral, onde não havia PIX e currículo Lattes.

Theotônio dos Santos e Vânia Bambina deixaram claro que o desenvolvimentismo quer modernizar o país sem autonomia nacional.

Paulo Guedes não despencou do céu.

Eu não tenho birra pessoal com Mangabeira Unger, talvez até tenha de ajoelhar-me ao milho por ter nele votado para deputado federal pelo PDT do Rio de Janeiro. Leonel Brizola o apoiou e nós, devotos militantes, fomos na onda. Erramos.

A mim me passou despercebido que o guru de Ciro Gomes fazia plagiato de Gunder Frank, substituindo-o com terminologia astuciosa (sem citá-lo) por Jacques Lambert, o sociólogo francês pelo qual Florestan Fernandes morria de amores com a teoria do dualismo sobre o atraso.

Gunder Frank foi sabotado e apagado pelo panteão petucano da USP e PUC carioca, assim como tiraram o brinquedo das mãos do professor Álvaro Vieira Pinto, o grande filósofo hegeliano e marxista.

O PDT, não o de Arnaldo Mourthé, colocou pá de cal na contribuição de Bautista Vidal que mostrou na área da energia os laços entre as perdas internacionais e a apropriação colonial do sol e da água doce.

Eu admiro a coragem física de Ciro Gomes, mas isso não basta para fazê-lo um patriota brizolista e quebrar o pêndulo petucano.

É nítido o recado de Nildo Domingos: com Mangabeira empaca o processo revolucionário. Deste mato, tal qual aconteceu com Celso Furtado, coelho não sai. Aos jovens militantes brizolistas aconselhamos a leitura do magnífico livro de Álvaro Vieira Pinto Por Que os Ricos não Fazem Greve? O desenvolvimento desenvolvimentista só desenvolve o desenvolvido. Jotaká continua sendo a Virgem Maria da economia política do automóvel.

Provavelmente Ciro e Mangabeira não irão responder à crítica de Nildo Domingos Ouriques, um pobretón pé de chinelo from Joaçaba. Enganam-se os que separam na biografia de Leonel Brizola o trabalhismo do marxismo. Daí é quem vem a conversa de urubu com bode sobre a “nova burguesia”. Há capitalismo bom e há capitalismo ruim então há “lucros honestos”, Karl Marx ironizou. O que são lucros desonestos?

O abuelo Otávio Mangabeira, que foi anti-getulista e prototucano, defendeu a simetria de interesse Brasil-EUA. Nosso Roberto Requião comete o mesmo equívoco de gostar mais de Roosevelt que de Vargas. Ex-partícipe dos governos Lula e Dilma, assoprou Mangabeira novidades para o presidenciável Ciro Gomes fascinado pela “turma do diploma”, a consagração ornamental do saber, ironizava Leonel Brizola.

Em 1990, vindo dos EUA, sem deixar de continuar morando por lá, Mangabeira Unger candidatou-se a deputado federal no Rio de Janeiro. Ninguém o conhecia. Durou seis meses sua campanha. Os militantes do PDT, atônitos com a chegada da nova estrela, perguntavam como e por que ele tinha caído nas graças de Leonel Brizola. Ninguém até hoje respondeu.

Afinal, quem bancou a candidatura a deputado de Mangabeira Unger? Rolava a fofoca que era amiguinho do banqueiro dandy Daniel Dantas, a “alma-moeda” que mistura hipocrisia e cinismo, no dizer de Karl Marx. O Daniel Dantas foi lançado pelo dendê de Antônio Carlos Magalhães para o cuidar dos bancos na Bahia.

Ciro Gomes foi para Harvard, aprendeu inglês e de lá voltou com a abstrata noção de “colonialismo mental” que disjunta colônia de capitalismo, o que corresponde ao sinuoso percurso de Mangabeira desde 1990, agora no regaço de um PDT que não está nem aí para a dominação imperialista. A “perdas internacionais”, a que se referia Leonel Brizola, é visto como uma furada leninista que não rende voto na Ilha da Maré.

Mangabeira requenta a marmita do “desenvolvimentismo”, todavia essa marmitex não é para ser aquecida, simplesmente por não haver classe social a fim de aquecê-la, daí a retórica de se criar uma nova burguesia da teologia da prosperidade. Parece que todos os caminhos empreendedoristas levam ao templo de Salomão ou à Academia Brasileira de Letras.

Nildo Domingos Ouriques é discípulo de Ruy Mauro Marini, o teórico da Polop e crítico do desenvolvimentismo, o qual já era um cadáver na época de Jotaká. Afinal, que burguesia que não se pinta a si mesma como desenvolvimentista?

Em política, dizia Leon Trotsky, é vital dar nome aos bois. Dar o nome correto. Nildo Ouriques fala em “liberalismo de esquerda” e “liberalismo de direita”. Em ambos os casos oculta-se a dependência e justifica a “burguesia comparadora” do PT, a burguesia bibelô da China.

Ciro Gomes é entusiasta da socialdemocracia europeia que vampirizou o marxismo. Mangabeira Unger, a Carmem Miranda de Caetano Veloso, é resignado diante da inconclusa soberania do país, portanto nada tem a ver com o ideário trabalhista desde a Campanha da Legalidade de 1961.

Os herdeiros da UDN fazem pouquíssimas referências ao golpe de 64, a grande tragédia da nossa história segundo Glauber Rocha, que abominava a pusilanimidade política de Tancredo Neves.

Pouca gente sabe que Leonel Brizola queria prender Tancredo Neves em um hotel cinco estrelas em Porto Alegre para não atrapalhar João Goulart em 1961. Fato é que atrapalhou com a formula do parlamentarismo, a antessala do golpe de 64.

João Goulart deu ouvidos a Tancredo Neves e aceitou o pacote tucano do parlamentarismo, ao invés de mandar os militares parlamentaristas para o pijamão da reserva.

Tancredo Neves foi o pombo correio da “solução parlamentarista”.

A filantropia do plano cruzado se repetiu com o plano real e com o bolsa família. Os presidentes ineludivelmente são os príncipes do obolo.

Karl Marx abominava a filantropia. Em 1989, na primeira eleição direta depois da ditadura, o PT recusou o acorde Brizula, o hibridismo de Brizola com Lula, simbolicamente o Sol Brizola e Lula a lua. Recusa cretina motivada pela vaidade de Francisco Weffort.

Lula iria pagar um preço altíssimo por rejeitar o convite de Leonel Brizola. Lula aliou-se à rede Globo, Collor venceu, depois veio Itamar e, por fim, FHC. É isso o que se entende por petucanismo: o PT in love com PSDB. É o amor paulistocêntrico de Lula por FHC. Este, professor da USP, foi discípulo de Florestan Fernandes. Leonel Brizola foi estigmatizado de “populista” pela sociologia da USP e IPERJ. E ninguém até hoje sabe o que significa “populismo”, vocábulo que não sai da boca pornô de Steve Bennon.

General que ganhava soldo de multinacional, Goubery se deleitava com a cisão esquizofrênica: Lula, separado de Brizola, era paparicado nas fábricas do ABC. Leonel Brizola pichado de líder anacrônico, representante arcaico da classe operária de chimarrão. Lula embarcou na vaidade política de parecer o que não era. A chapa Brizula foi abortada na história.

Com o seu léxico de beduíno dos pampas Leonel Brizola charlava que Lula popstar havia tomado gosto pela pizza e olvidado a farinha de mandioca.

Brizola já era, entoou Frei Beto, o anti-estética da fome.

O longo exílio de Leonel Brizola foi considerado algo de pouca monta pelos professores nas universidades. Com o tempo o golpe de 64 foi esquecido e recentemente exaltado nos quartéis enviagardos de Jair Bolsonaro. Este foi eleito por uma subcultura de programa de auditório que viu com bons olhos a derrubada de João Goulart. O arreglo petucano é o style telenovela da Globo. Resultado: o judiciário telenovelizado adubou o terreno para Jair Bolsonaro.

A telenovelística de chanchada comoveu Ciro Gomes, assim como Mangabeira foi seduzido por Roliudi. Jair Bolsonaro ajoelha-se diante da bandeira dos EUA a lembrar o beijo udenoentreguista de Otávio Mangabeira dado no anel de Eisenhower. O fio entreguista da história é baixo astral.

Bautista Vidal percebeu que não por acaso a Cepal desenvolvimentista de Raul Prebisch escolheu Celso Furtado e FHC como os gênios da raça. Curiosamente Gunder Frank os desqualificou do ponto de vista conceitual.

Não me lembra a palavra “republicano” figurar na linguagem de Leonel Brizola e de Friedrich Engels. Quem falava em “república democrática” era Stalin. Isso de “espirito republicano” é isca latifundiária “for export”. Os doutos em constituição (a qual não é feita pelo povo) são coniventes com os lucros exportáveis. São os pedantes da linguagem empolada e dos interesses do capital monopolista estrangeiro. O idioma policial “lava-jato” ou “lavajatismo” converte-se em gnose jurídica. Não por acasso Ulisses Guimarães, o bacharel de Cananéia da Constituinte, costeou o alambrado em 1964.

A plêiade do PDT atual acha que Leonel Brizola fracassou porque brigou com a TV Globo. Deu murro em ponta de faca. Um neurótico masoquista. A decadência vital da esquerda explica a desistência de Dilma em não querer lutar, ou seja, o seu desejo inconfesso de ser derrubada. Entregar o time sem resistir. Leucemia política. É isso o que Leonel Brizola não suportava, Glauber Rocha também. Em conversa com os amigos retornava sempre ao assunto: Getúlio Vargas não deveria ter dado um tiro no coração, Jango deixou as portas do Palácio abertas para a Fiesp fazer a festa.

A propósito consinta a analogia: Nildo Ouriques se insurge colérico contra Dilma por não ter reagido ao golpe do falsário Sérgio Moro, o Marlon Brando das foliculárias da Globo Nius.

Em seus dois governos Lula não organizou uma mídia contra-dominante. Confiou na imprensa burguesa e caiu do cavalo. A fraqueza política é um dos traços típicos da alienação colonial. Bautista Vidal adorava a frase de Lampião: se pedir perdão, eu mato.

Ciro Gomes foi o operador e não o formulador do plano real. Ele não se cansa de elogiar esse plano medíocre que teve por objetivo engordar o capital financeiro. Segundo Nildo Ouriques, o plano real transformou alguns professores universitários em banqueiros. Ciro Gomes é cerimonial e respeitoso com FHC, passa-lhe a mão na cabeça cheia de barretes acadêmicas, como dizia Leonel Brizola.

O artigo de Nildo Domingos Ouriques por ser radical, na acepção marxista de tomar as coisas pela raiz, não terá repercussão nas universidades, tampouco será respondido. O que está nele delineado é que de Itamar Franco origina-se o “liberalismo de esquerda”, Ciro, FHC, Ricupero, Plano Real, Lula e Dilma. Leonel Brizola não queria o impitichi de Collor, não por achar o caçador de marajá uma gracinha. É que o PSDB somente chegaria ao poder pela via do golpe branco. A reeleição de FHC liquidou com a Petrobrás.

Itamar Franco, a despeito de sua intenção, é o criador do petucanismo. Recusou o convite para seu vice de Leonel Brizola, preferiu Fernando Collor. O ex-ministro Ciro Gomes contribuiu para a engrenagem rentista do capitalismo vídeo-financeiro.

A classe dominante brasileira só admite a democracia sob a condição de fazer uso da esmola para engambelar o povo na hora de votar.