quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Samba da sociedade infeliz

109 anos de Noel Rosa

A indústria capitalista do barulho. A mais-valia acústica deforma a audição. Os trabalhadores são as principais vítimas. Em muitas atividades funcionais do dia a dia é dispensável o ruído, mas este nunca desaparece; ao contrário aumenta cada vez mais.

A anatomia civil da sociedade capitalista depois de 1945 exige a abordagem sonora. É isso o que fez Theodor Adorno completando a análise de Marx que não conheceu a eletrônica. Esta não altera a essência do capitalismo, porém o rádio e a televisão interferem na maneira de ouvir, falar e pensar.

O repúdio capitalista ao silêncio. A morte deixa de ser surda com a motoca. Se a consciência de classe do proletariado for depender do funk, estamos fodidos.

Falsa alegria. A música popular entorpece o ouvido. A capacidade de conversar é erodida. Ouve-se sem ouvir. Afasia é coletiva.

O ouvido do trabalhador continua dentro da fábrica ao ouvir a indústria cultural.  A telenovela está fora e dentro da fábrica.

Interclassista com massa sobrante e os estamentos multinacionais. Luta de classes. A onipresença do ruído é burguesa.

Ninguém é maluco de afirmar que o real curso da história depende do que se ouve; todavia equívoco é não considerar que a classe social no subdesenvolvimento está envolvida em relações sonoras e óticas. Os partidos políticos operam com o mesmo padrão acústico, a despeito das diferentes classes que eles representam.

A impressão que se tem, analisando o programa eleitoral gratuito, é que a sociedade é uníssona. Todos os sons são um único e mesmo som.
Nos últimos 50 anos a compulsão tagarela, falar sem dizer nada, suprimiu o desejo de ouvir. A cortesia é do barulho.

A posse da ministra do Supremo Tribunal Federal foi entoada por cantor de telenovela. Redundante é falar em juristização da política. Na verdade o judiciário é um apêndice da telenovela.

Viva Marcela
Lá lá lá
Viva telenovela
Lá lá lá lá

Roliudi forneceu o aplicativo cosmético para o star-system. Reparem a gravata de Gilmar Mendes, o ministro Flux trocando de abotoadura, Levandowski pintando o bigode de Merval Pereira. O judiciário espelha e reproduz a gestuália telenovelística.

O banco é o sujeito, o predicado é o judiciário.

Karl Marx, que fez a crítica do direito de Hegel, dizia que o banco era o areópago da nação, ou seja, o Supremo Tribunal de Atenas.

O julgamento jurídico legitima a sociedade dividida em classes. A lei, em sua origem, é política.

Inexiste juiz imparcial, assim como a igualdade democrática é uma quimera.

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